Era década de 40. Naquele tempo, os políticos arrastavam as vogais em seus discursos para serem compreendidos através do rádio. Nas regiões mais distantes, no meio dos chiados, a voz brandava de um pedaço de plástico como um canto prometendo melhorar a vida das pessoas. Tudo era dito pausadamente, ainda que no grito, reforçando cada pedaço de cada palavra.
E havia os slogans. O do brigadeiro Eduardo Gomes, da UDN, na corrida presidencial de 1945, era:
- Vote no Brigadeiro. É bonito. É solteiro.
O doce de brigadeiro, aliás, surgiu em sua campanha, quando entusiastas da candidatura, em busca de fundos, criaram bolinhos de doce de leite com chocolate granulado como cobertura, e diziam: “é para o brigadeiro, para a campanha do brigadeiro”. O nome pegou. E o doce também.
O bonitão solteiro, entretanto, não decolou. O exigente eleitorado feminino escolheu o feio e casado Eurico Gaspar Dutra. Eduardo Gomes ficou com apenas 35% dos votos.
E havia os jingles, muitos deles. O de Getúlio, na campanha de 1950 – contra o mesmo Eduardo Gomes – chamava-se Retrato do Velho (o mesmo que o deputado petista Cândido Vacarezza propagandeou esse ano para pedir a volta de Lula).
“Eu já botei o meu. E tu, não vais botar? / Já enfeitei o meu. E tu vais enfeitar? / O sorriso do velhinho faz a gente se animar”
O velho Getúlio venceu a eleição, com 48,73% dos votos, voltando ao poder pela segunda vez – de onde sairia morto. E o brigadeiro solteiro não decolou outra vez.
Na década de 50, o país viu nascer o mito de Juscelino Kubitschek. É dele, um pé de valsa confesso, a máxima:
- Se me virem dançando com uma mulher feia é porque a campanha já começou.
Vencedor das eleições de 1955 contra o cearense Juarez Távora, pelo PSD, JK tinha como mote de campanha 50 anos de progresso em 5 de governo, e em seu jingle era anunciado como o homem:0
Juscelino, Juscelino é o homem / Que além de patriota é nosso irmão / Brasil, vamos para as urnas / Povo democrata, gente varonil / Juscelino, Juscelino, Juscelino / Para presidente do Brasil!”
O mineiro venceu as eleições com uma margem de 400 mil votos. Seu vice foi João Goulart.
“Varre, varre vassorinha” era o jingle de Jânio Quadros na eleição de 1960. Seu adversário na eleição, o marechal Henrique Lott, tinha uma espada como símbolo – referência a uma espada de ouro que recebeu de Juscelino Kubitschek.
A figura da vassorinha era o contra-ataque do marechal: “O povo sabe, sabe, sabe, não se engana / Essa vassoura é de piaçava americana / Mas a espada de nosso marechal / Foi fabricada com aço nacional”.
“Varre, varre vassorinha / Varre, varre a bandalheira / O povo já está cansado de sofrer dessa maneira”
Jânio enfrentou na mesma eleição o ex-governador de São Paulo, Adhemar de Barros, do PSP, que sempre marcava seus comícios nas cidades no dia anterior à presença do candidato vassourinha. Em certa ocasião, em Mogi Guaçú, sabendo de seu comício no dia seguinte, Adhemar brandou de cima do palanque, em tom de chacota:
- Entre as várias obras que fiz em São Paulo está o Pinel, hospital de loucos. Infelizmente, não foi possível internar todos. Um desses loucos havia escapado e fará comício nesta mesma praça amanhã.
No dia seguinte foi a vez de Jânio, depois de um longo discurso, devolver a indireta na mesma moeda:
- Quando fui governador de São Paulo, construí várias penitenciárias, mas não foi possível trancafiar todos os ladrões. Um escapou e fez um comício aqui mesmo nesta praça ontem.
Depois de algumas décadas de silêncio da democracia, todas as tribos políticas se juntaram nas eleições de 1989. Ao todo, 22 chapas disputaram a campanha. Nessa eleição, Silvio Santos – ele mesmo – fora anunciado como candidato à presidência pelo PMB no lugar de Armando Corrêa, mas teve sua candidatura impugnada às vésperas do pleito – o partido foi extinto por irregularidades em seu registro. Ainda assim, o homem do baú gravou todos os programas do primeiro turno de uma única vez, nos estúdios do SBT.
A campanha contou com nomes emblemáticos do cenário político, como Lula, Brizola, Maluf, Covas e Ulysses Guimarães, mas foi um estreante no cenário nacional quem chamaria a atenção – Fernando Collor.
Horas antes do último debate na TV, Marisa Letícia, mulher de Lula, foi chamada ao telefone pela campanha de Collor para ouvir que o marido havia presenteado uma amante com um aparelho de som. Mas isso não seria o bastante. No último dia de seu horário eleitoral, Collor levaria Miriam Cordeiro, ex-namorada de Lula, para acusá-lo para o país inteiro de que o sindicalista havia tentado forçá-la a praticar um aborto ─ e de repudiar a filha Lurian depois do nascimento. Miriam dizia que ele, ao saber da gravidez, sugeriu que ela abortasse. Depois, disse que ele era racista, que não gostava de negros. O depoimento gerou indignação – no dia seguinte Collor seria publicamente censurado pelo senador Fernando Henrique Cardoso e pelo deputado federal José Serra.
Lula respondeu a Collor levando sua filha, Lurian, em seu último programa. A indignação, porém, seria esquecida – as conveniências políticas levaram ambos a serem aliados tempo depois.
É de 1989 também um dos jingles mais emblemáticos das campanhas presidenciais, Lula-la… Brilha Uma Estrela (que seria gravado por Chico Buarque, Djavan e Gilberto Gil).
“Lula-lá, brilha uma estrela / Lula-lá, cresce a esperança / Lula-lá, o Brasil criança na alegria de se abraçar”
Fernando Collor venceu as eleições, no segundo turno – de onde sairia 2 anos depois, através de um processo de impeachment. A eleição, porém, foi um circo.
A campanha das mãos de Fernando Henrique, em 1994, foi outro grande momento das eleições presidenciais. “Levanta a Mão”, cantada pelo sanfoneiro Dominguinhos, foi criada pelos publicitários Nizan Guanaes e Sérgio Campanelli e o conhecimento musical de César Brunetti. Na época, era consenso que o jingle era uma estratégia de marketing para angariar votos no Nordeste do país, onde FHC não tinha um sólido eleitorado. Também foi considerado uma alfinetada em Lula – que perdeu o dedo mínimo da mão esquerda em uma máquina.
O resultado veio nas urnas: Fernando Henrique venceu a eleição de Lula no primeiro turno. Em 1998, onde se sagraria vencedor em cima do sindicalista novamente no primeiro turno, as mãos voltariam.
Em 2002, depois de perder por 3 vezes seguidas, foi a vez de Lula se sagrar presidente. Não sem antes ver José Serra, seu oponente, colocar a atriz Regina Duarte para dizer que tinha medo dele. O vídeo de um jovem universitário chamado João foi um dos grandes momentos da campanha. Sobre ele, Duda Mendonça, marqueteiro do PT na ocasião, disse:
- Dizem que o marketing despolitiza a campanha. Desculpe, mas eu não concordo. O bom marketing apenas adequa a linguagem política, em muitos casos pesada e complicada, a um formato criativo compatível com o público e o veículo a que ela se destina. Veja o caso do filme João, que fiz na campanha de Lula, em 2002. O texto, se gritado num comício, na boca do próprio candidato, certamente seria interpretado como uma mensagem radical que poderia amedrontar muita gente. Mas da forma como foi feito, a mensagem foi passada sem esse risco.
Lula venceu a eleição no segundo turno. Venceria novamente de Geraldo Akckmin, 4 anos depois, também no segundo turno.
Por fim, há 4 anos, foi a vez de Dilma Rousseff. A candidata porém, foi personagem coadjuvante de Lula, presente em quase todos os momentos em primeiro plano da campanha. A tática de dialogar com o Nordeste – como Fernando Henrique fez em 1994 e 1998 – foi repetida. O fato de Dilma poder se tornar a primeira mulher presidente também foi explorado. Mas a campanha, nem de longe, alcançou os momentos que FHC e Lula haviam gerado nas últimas eleições – ainda que João Santana, seu marqueteiro, tenha a conduzido com brilhantismo (vale lembrar que Dilma nunca foi uma figura pública e era até então desconhecida do eleitorado). José Serra foi novamente o opositor derrotado.
E agora, quem irá construir a história?
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